Ampliação do Direito a Acompanhante: Uma Análise Crítica da Lei nº 14.737/2023

A Lei nº 14.737/2023, sancionada em 27 de novembro de 2023, ampliou o direito da mulher a ter acompanhante em consultas, exames e procedimentos realizados em unidades de saúde públicas e privadas. Apesar de representar um avanço, a nova lei apresenta uma restrição potencialmente problemática no §4º do artigo 19-J.
Ampliações do Direito:
- A lei amplia o direito a acompanhante para além do trabalho de parto, parto e pós-parto imediato, abrangendo agora toda ordem de consultas, exames e procedimentos.
- A proteção é ampliada para casos em que a paciente esteja impossibilitada de indicar acompanhante ou quando o atendimento envolva sedação ou rebaixamento do nível de consciência.
- A obrigatoriedade de aviso informativo sobre o direito a acompanhante em local visível foi mantida e ampliada para todas as unidades de saúde, não apenas hospitais.
Restrição do Direito:
- O §4º do artigo 19-J permite a restrição do acompanhante em “centro cirúrgico ou unidade de terapia intensiva com restrições relacionadas à segurança ou à saúde dos pacientes, devidamente justificadas pelo corpo clínico”.
- Essa restrição é nova e não existia na legislação anterior.
- A redação genérica da norma confere ampla discricionariedade ao corpo clínico, podendo levar a interpretações arbitrárias e restrições indevidas.
Críticas à Restrição:
- A norma visa coibir violações que podem ocorrer durante consultas, procedimentos e exames, inclusive por parte do corpo clínico.
- A restrição do acompanhante, em determinadas situações, pode dificultar a coibição de abusos e violações dos direitos das mulheres.
- A violência obstétrica, por exemplo, demonstra a necessidade de um acompanhante de confiança para garantir a segurança e o bem-estar da paciente.
- A falta de critérios objetivos para a restrição pode levar a abusos e violações, especialmente para mulheres mais vulnerabilizadas.
- A insuficiência das instalações não é motivo legítimo para negar o direito a acompanhante, pois a responsabilidade por instalações adequadas é da instituição de saúde.
Interpretação Adequada da Norma:
- A restrição do direito a acompanhante deve ser interpretada de forma restritiva, por se tratar de uma cláusula excepcional e limitativa.
- A negativa do acompanhante deve ser individualizada, justificada por escrito e fundamentada em motivos técnico-científicos relacionados à saúde ou à segurança dos pacientes.
- A justificativa do corpo clínico deve ser subscrita pelos profissionais de saúde responsáveis e passível de contestação por um terceiro profissional de saúde.
- A insuficiência das instalações não é motivo legítimo para negar o acompanhante.
- Mesmo nas hipóteses de restrição, a paciente ainda poderá ter um acompanhante profissional de saúde de sua livre escolha.
Conclusão:
A ampliação do direito a acompanhante é um avanço importante, mas a restrição presente no §4º do artigo 19-J exige uma interpretação rigorosa e criteriosa para evitar abusos e violações dos direitos das mulheres. É necessário um esforço conjunto para garantir que a lei seja aplicada de forma justa e eficaz, assegurando o direito fundamental da mulher a um acompanhante de sua confiança em consultas, exames e procedimentos médicos.